Por novos futuros – Afroempreendedorismo: onda ou oportunidade?
Renata Câmara fala sobre como o movimento de afroempreendedorismo cresce como uma alternativa para o fortalecimento da economia negra, valorizando a herança cultural e impulsionando novos modelos de negócios
13 de novembro de 2024
A última prova do Enem trouxe para os estudantes como tema da redação os desafios para a valorização da herança africana no Brasil. Por si só, uma baita provocação para as novas gerações de profissionais estarem atentas à riqueza, muitas vezes despercebida, de valores, cultura e conhecimento que herdamos da miscigenação com os povos africanos. Ainda mais neste primeiro ano em que o país terá o dia da consciência negra como feriado nacional.
O reflexo do aproveitamento dessa herança pode ser visto nas empresas. Um levantamento do Sebrae aponta que, nos últimos 20 anos, pessoas pretas e pardas à frente de pequenos negócios cresceram 22%, somando 15 milhões de empreendedores. Naturalmente, lideranças que compreendam e expressem em seus produtos, e serviços, aspectos que valorizem essa herança cultural serão reconhecidas no mercado de forma diferenciada, trazendo valores como autenticidade e resgate de crenças e costumes ancestrais.
É neste contexto que surge o conceito de afroempreendedorismo, fenômeno de caráter econômico, político e social que incentiva a pessoa negra a desenvolver uma atividade empreendedora, criativa e inovadora, com ou sem o auxílio de colaboradores diretos e indiretos. São negócios construídos e gerenciados nos mais diferentes nichos de mercado, tendo como público toda a sociedade. Mas também incentiva o black money, estimulando a compra e venda de produtos e serviços entre pessoas negras, ou seja, pretas e pardas, incluindo e empoderando estes consumidores numa perspectiva mais identitária e comunitária.
Como tendência e não apenas como onda, há um crescimento do consumo de produtos e serviços por várias razões. Uma delas se justifica porque os afroempreendedores conhecem de maneira mais profunda e por experiência própria, as necessidades e lacunas de consumo da população negra, que é de fato majoritária. O mercado ainda é muito centrado nas necessidades das pessoas brancas e pelos padrões e referenciais de consumo pasteurizados por uma indústria de escala que predomina há décadas e até séculos.
Outra razão é o fato de muitos serviços e produtos de afroempreendedores trazerem aspectos de valorização de influências ancestrais, seja a moda africana, as tranças e cortes de cabelo black power, a culinária e seus elementos de diferenciação, além do olhar captado por centenas de pintores, artistas plásticos, fotógrafos, produtores de vídeo e outras categorias da econômica criativa e também na economia tradicional.
Ressaltar ainda que o afroempreendedorismo é um movimento que também vem de encontro ao racismo estrutural que ainda enrijece relações, corporações e a sociedade como um todo, cheia de resquícios de um tempo de desigualdades explícitas e naturalizadas. A própria contratação de pessoas negras, oportunizando talentos que “normalmente” têm mais dificuldades para ocupar os mesmos espaços públicos e de trabalho de pessoas brancas, é algo cada vez mais percebido como ação afirmativa não apenas de governos e políticas públicas, mas da própria sociedade civil.
Startups surgem para diversificar os modelos de negócios incluindo necessidades e resolução de problemas para a população negra. Comunidades quilombolas resgatam sua identidade por meio de atividades culturais e de negócios que valorizam a ancestralidade de seu povo. Assim, o afroempreendedorismo vai trançando seu caminho, apontando cada vez mais oportunidades e minimizando desigualdades.
Sobre Renata Câmara
Renata Câmara é analista de Educação Empreendedora e pós-graduanda em Desenvolvimento Sustentável e Economia Circular pela PUC-RS.