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Foto: Carla Belke

Por novos futuros: nas trilhas do desenvolvimento local sustentável

Cidades do interior nordestino desafiam estigmas, adotando modelos sustentáveis de desenvolvimento. Conheça casos inspiradores.

29 de fevereiro de 2024

Antes de afirmar, vou começar indagando. Qual a sua referência de cidade desenvolvida? Por quais ângulos você analisa e chega à conclusão de que um lugar é mais desenvolvido que o outro? Presença de grandes rodovias? Comércio pujante e fluxo intenso de pessoas e veículos? Consulta indicadores como o PIB?

 

Há um debate crescente na sociedade, nas políticas públicas em geral e na academia sobre qual o tipo de desenvolvimento que se espera para as cidades, no presente e no futuro, diante da complexidade das mazelas sociais, das mudanças radicais nos modelos de negócios com o império vitalício da internet e suas plataformas e das demandas ambientais que clamam por redução de danos ao planeta.

 

Minha intenção aqui neste artigo é mostrar como alguns municípios paraibanos estão virando a mesa, invertendo o jogo de dados da economia tradicional e mostrando que é possível construir bases para novos modelos de desenvolvimento. Antes disso, lembro de ter assistido no final do passado, impactada, uma “reportagem da reportagem” no Jornal Nacional que lembrava momentos marcantes da tv brasileira.

 

Nela, o repórter contava que, na década de 80, produziu muitas matérias que retratavam a seca no Nordeste e o sofrimento das famílias das cidades interioranas que não dispunham de água, escolas e hospitais; comiam calangos e preás (animais típicos da caatinga) pra não morrer de fome e sobre as crianças que brincavam com ossos de animais na ausência de brinquedos.

 

Quem assistiu àquelas matérias construiu uma imagem do Nordeste que se arrastou durante muitos anos, estigmatizando a região como pobre e atrasada. Mas, muitas dessas mesmas cidades, mais de três décadas depois são faróis apontando que é possível superar adversidades e instabilidades climáticas para encontrar meios de promover o desenvolvimento local e com a olhar da sustentabilidade: ambiental, social e econômica.

 

Em 2002, ao trabalhar durante alguns anos na região do Cariri paraibano, conheci o município de Cabaceiras, que só teve destaque da mídia nacional antes disso por cravar o menor índice pluviométrico do país.

 

Pois lá mesmo, onde o bode já reinava por sua resiliência ao bioma da caatinga, foram feitas as gravações do filme O Auto da Compadecida, que estourou a bilheteria do cinema nacional e a caprinovinocultura, junto com o turismo rural viraram vetores de desenvolvimento. Pra se ter uma ideia, a cidade passou a registrar em alguns anos seguintes a presença de mais turistas estrangeiros que a própria capital da Paraíba, João Pessoa, destino de sol e mar.

 

A propósito, nesta semana, estou participando de um curso de gestão de projetos na cidade de Araruna, na microrregião do Curimataú, com 590 metros de altitude. Aqui, a história, a cultura e o turismo de aventura se entrelaçam e dão novo ritmo aos negócios do município, ampliando a geração de renda baseada em atividades criativas e sustentáveis de base comunitária, tendo como atrativo central o Parque Estadual Pedra da Boca.

 

Junto com Tacima, Dona Inês e Riachão, municípios vizinhos, Araruna conseguiu certificar a primeira trilha de longo percurso do Nordeste, o Caminho das Ararunas, que percorre mais de 130 km de estrada entre veredas e paisagens exuberantes da nossa caatinga, incluindo pontos de parada em comunidades locais e até quilombolas. Tudo isso para gerar mais uma experiência diferenciada com a natureza, respeito aos nativos com suas tradições, culinária e saberes.

 

Imaginem então o que a nossa versão nordestina do “Caminho de Santiago de Compostela”, poderá impactar em termos de diversificação e fortalecimento dos negócios locais, de toda a cadeia produtiva do turismo: meios de hospedagem, transporte, alimentação, cultura, entre outros.

 

É nesta pisada que casos como estes se multiplicam, inspirando e mudando gradativamente a cara do interior do Nordeste, rico em vocações antes inexploradas e que passavam despercebidas pelas gestões públicas municipais. Um farol multifocal que também desafia as médias e grandes cidades a revisitar seu passado, suas próprias potencialidades e sua criatividade, pra buscar alternativas viáveis e gerar oportunidades, mirando futuros mais promissores e sustentáveis.