Pablo Perini: “Com mais iniciativas de educação e degustação, estamos mostrando ao consumidor que o vinho nacional tem qualidade e identidade próprias”
Sommelier, membro do conselho administrativo, diretor de marcas e P&D da vinícola Casa Perini, compartilha detalhes sobre os novos espumantes, destaca a receptividade nordestina e os desafios de unir tradição e inovação
19 de dezembro de 2024
Conhecido por sua expertise e por contribuir significativamente para o mercado de vinhos brasileiro, Pablo Onzi Perini é uma referência quando o assunto é espumantes de qualidade. Formado como Sommelier Internacional pela FISAR (Federazione Italiana Sommelier Albergatori Ristoratori) e aprovado com mérito no nível 3 da WSET (Wine & Spirits Education Trust), Pablo também é membro do conselho administrativo, diretor de marcas e P&D da renomada Vinícola Casa Perini. Durante sua recente visita à Paraíba, ele compartilhou detalhes sobre a nova linha Vintage, insights sobre o mercado nordestino e os desafios de criar produtos que unem tradição e inovação. Confira abaixo uma conversa rica e detalhada com esse grande nome do universo dos vinhos e espumantes.
Pablo, qual foi o motivo da sua visita à João Pessoa?
Minha visita a João Pessoa faz parte de um circuito nacional de divulgação da linha Vintage, uma série de espumantes superiores que a Casa Perini lançou. A Casa Perini já é bastante reconhecida pelo terroir da Serra Gaúcha, muito propício para a elaboração de espumantes, vinhos brancos, rosés e tintos. Contudo, percebemos uma carência de uma linha superior de espumantes em nosso portfólio. Assim, em 2023, lançamos a linha Vintage, que tem um posicionamento de mercado mais elevado, destinado a canais especializados como wine bars, delicatessens e restaurantes finos. Essa linha é diferente tanto pelo terroir quanto pelas técnicas utilizadas em sua produção. Estamos com um trabalho maior de penetração em relação a mercados que a gente já tem atuação, mas que por meio dessa linha conseguimos um acesso a canais mais especializados justamente devido a um posicionamento de mercado que essa linha permite.
Você comentou sobre os espumantes da linha Vintage. Poderia nos explicar o que faz esses produtos serem tão especiais?
A linha Vintage tem esse nome justamente por trazer espumantes que são safrados. Tradicionalmente, espumantes não levam a indicação da safra, porque a herança de Champagne, cidade francesa, é de mesclar bases de diferentes safras para garantir consistência no produto final. Contudo, quando temos uma safra excepcional — como foi o caso de 2022 —, decidimos destacar isso e criar algo único.
Além disso, adotamos técnicas de elaboração que garantem uma experiência sensorial única. Por exemplo, trabalhamos com rendimentos mais baixos no vinhedo — cerca de 7 a 8 toneladas de uvas por hectare, enquanto normalmente seriam colhidas até 20 toneladas. Isso concentra mais aromas e sabores nas uvas. Também utilizamos longos períodos de contato com as leveduras após a fermentação, o que tem como consequência um espumante mais rico e mais complexo em termos de aroma e sabor. Tudo isso vai fazer com que a entrega seja muito superior.
Você está diretamente envolvido em diversos setores da elaboração da Vintage, como se deu esse processo de cada rótulo?
Na Casa Perini, me envolvo com a parte de gestão das marcas, P&D que é pesquisa e desenvolvimento de produtos e também como sommelier acabo pensando no que é conceitual, no lançamento dos produtos, no que vai antes do líquido, o storytelling. Para a uva pinot noir, que utilizamos em alguns produtos da linha, decidimos colher um pouco antes da maturidade total para preservar uma acidez vibrante, essencial para espumantes. Além disso, adotamos a técnica da batonnage, para os quatro primeiros rótulos da linha, que consiste em movimentar as leveduras no fundo dos recipientes para intensificar o contato com o vinho. Isso resulta em uma textura mais cremosa e um leque aromático mais rico.
A degustação sequencial da linha Vintage inicia com o Casa Perini Vintage – Blended, Nature, elaborado com cerca de 20% de uvas pinot noir e 80% de Chardonnay, que é a rainha das uvas brancas. Na escala, ele é o mais seco. Não temos extra brut na linha Vintage e o próximo rótulo é um Casa Perini Vintage – Brut, Blanc de Noir, traduzindo é branco do tinto, ele também utiliza a pinot noir e faz uma fermentação dela, mas sem contato com a casca. Dessa maneira, mesmo sendo branco, o Blanc de Noir tem na alma a polpa da Pinot Noir. Ele tem uma gama de aromas que costumamos comparar com ameixa amarela, uma ponta de nectarina e physalis.
Na sequência temos mais um brut, o Casa Perini Vintage – Brut Rosé, Rosé de Noir, que, de novo, estamos falando de pinot noir, mas esse é rosé porque deixamos fermentar um tempo em contato com a casca. Ele tem uma cor elegante levemente rosada e entrega notas que vão lembrar rosas, jasmin e chá de hibisco. O rótulo seguinte é o Casa Perini Vintage – Barriqué, Brut Barricado, um processo de envelhecimento em barricas de carvalho. Usamos Chardonnay 100% que interagem muito bem com a madeira, no caso carvalho, e 20% desse total é utilizado trazendo notas de baunilha, chocolate branco e amanteigado.
O último é o Moscatel Blended com três uvas na composição: Moscato R2, Giallo e Hamburgo. Esse blend das três cria uma riqueza de aroma com notas de ameixa branca, uva passa, damasco e favo de mel. O Casa Perini Vintage – Liqueuer Moscatel Blended tem uma nota mais licorosa. Cada etapa foi pensada para garantir que a linha Vintage fosse realmente especial.
Como você vê a receptividade do mercado nordestino?
No Nordeste, percebemos uma grande adesão aos rosés, o que é muito interessante. Embora não existam pesquisas específicas sobre o motivo dessa preferência, acredito que isso se deva tanto ao perfil aromático dos rosés, que é mais leve e frutado, quanto ao apelo visual. O rosé é alegre, vibrante, e tem um charme que cativa, especialmente o público feminino. Temos um produto que é um fenômeno de vendas nacional, tanto de público quanto de crítica: o Aquarela. Ele é um espumante rosé com uma coloração super alegre e vibrante, não muito intenso, mas que tem uma tonalidade que cativa os olhos, além de um equilíbrio perfeito entre dulçor e acidez. Esse perfil aromático e visual torna o Aquarela muito bem aceito não apenas no Nordeste, mas em todo o Brasil.
O Brasil tem essa possibilidade de exploração de terroirs e de características e bebidas. O espumante, especialmente o moscatel, pode funcionar como entrada para esse universo fantástico que são os vinhos como um todo. Dentro da linha Vintage também temos isso, um espumante de coloração rosada que é o Rosé de Noir.
Você mencionou eventos como jantares harmonizados durante o circuito. Como tem sido essa experiência?
Cada edição desse circuito se configura num formato diferente, por exemplo, há situações em que chefs elaboram cardápios harmonizados especialmente para a noite do Vintage. Degustamos cada prato com um vinho específico em ordem crescente, do mais seco e intenso para o mais doce, inclusive em João Pessoa. Esses eventos ajudam a desmistificar a ideia de que o espumante é apenas para festas, noite de Natal ou ocasiões especiais. Ele é muito versátil e pode acompanhar pratos diversos, em várias ocasiões, até uma tarde na beira da praia ou piscina.
Como você enxerga o futuro do mercado de vinhos e espumantes no Brasil?
É surpreendente o nível de interesse que o público final tem em relação ao vinho, apesar de ainda existir um grande desconhecimento sobre os rótulos brasileiros, mas isso está mudando. Com mais iniciativas de educação e degustação, estamos mostrando ao consumidor que o vinho nacional tem qualidade e identidade próprias. O espumante, especialmente, é um grande trunfo do Brasil, pois o terroir da Serra Gaúcha oferece condições ideais para sua elaboração.
Com degustações, as pessoas se interessam mais por saber como o vinho é elaborado, quais são as uvas e então viram multiplicadoras. O consumidor compra e sai contente e orgulhoso, então realmente esse circuito faz parte de um trabalho de formiguinha. O vinho é uma bebida de paixão, que carrega consigo um encanto e está acontecendo uma virada de chave, na qual há maior diversidade nos rótulos e isso acaba se tornando confuso para o consumidor. Ele tem que entender o que tem dentro daquela garrafa e faz parte do papel da indústria e do comerciante, sommelier, distribuidora – quando falamos em vinho nacional – fazê-lo entender e ficar mais cativada pelo mundo dos vinhos. Elas descobrem que podem ter um hábito saudável e descobrir uma vida enogastronômica de mais prazer e conhecimento associado, isso potencializa a apreciação.
Fonte: Andréia Barros